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quinta-feira, 25 de julho de 2024

o infinito e o universal como liberdade

o positivismo é fascinado pelo fato e pelo dado: sua razão fria e calculista é máscara. por baixo da máscara está um fetichista cujas pupilas se dilatam, extasiadas, diante da forma-fato, da forma-dado. essa é a dimensão mais obscura da retórica da clareza. por trás das formas mais transparentes é onde melhor se ocultam segredos. (é a lição da carta roubada de edgar allan poe). e sob a forma acabada da facticidade, sob o domínio tranquilo da positividade, estão cifrados instintos terríveis, morais ancestrais, metafísicas esquecidas, que retomam, no presente nosso, a realidade reificada pelas forças invisíveis da história.

nesse sentido, o conceito de totalidade investe contra a finitude e determinação perversa própria da historicidade. diante da objetividade, da imediatez e da auto-evidência, a totalidade abre a história para o outro, para o incondicionado, para as figuras do infinito capaz de desfazer a identidade despótica do particular e do positivo no espaço em branco, a ser criado, do negativo. vingança do presente contra o passado pelas armas do futuro: no insignificante aberto pela negação pode-se recuperar, esperamos, alguma autonomia, alguma liberdade. 

essa caracterização iluminista do infinito, que luta contra a determinação da historicidade, do tempo e do espaço, contra tudo que nos condicione por fora da reflexão ativa, não obstante seja hoje avaliada como parte de um movimento universalista, capaz de supra-sumir toda forma de não identidade na identidade total, aos iluministas ou pós-iluministas (penso em hegel, husserl, dilthey) surge, ao contrário, como possibilidade de se libertar do irracional, das forças que nos dirigem sem que nos saibamos dirigidos, da identidade inconsciente, na direção do outro, do novo, da diferença; enfim, o infinito, em tensão com o imediato da história, do aqui-agora, é força capaz de romper a potência estacionária do passado, a opressão daquilo que está pensado e esquecido como pensado, e iniciar a possibilidade de crítica e progresso.

"em hegel a totalidade não pode ser vista como negação simples do particular, como subsunção completa das situações particulares a uma determinação estrutural genérica. ela será a consequência necessária da compreensão do particular ser sempre mais do que si mesmo, de ele nunca estar completamente realizado. na verdade, ela aparecerá como condição para que a força que transcende a identidade estática dos particulares não seja simplesmente perdida, mas possa produzir relações". (glosa de safatle à "três estudos de hegel", p. 26 - 27).

sábado, 15 de junho de 2024

depois de kant: positivismo e metafísica no espaço transcendental

na história das ciências humanas escrita por foucault, a filosofia de kant adquire a importância de um singular acontecimento. depois de sua célebre crítica à metafísica, foucault indicará duas tendências opostas e conflitantes que, não obstante, estão erguidas sobre o mesmo terreno movediço deixado pela crise da representação clássica. 

tornada impossível a pretérita correspondência entre as palavras e as coisas, com a filosofia avançando na direção das relações transcendentais entre as representações, dos fundamentos subjacente a toda experiência, surgem duas escolas cuja guerra orientou a filosofia do XIX: por um lado, o positivismo, que declarado proibido o conhecimento das essências, despreza a metafísica como incognoscível, e se decide a estudar os fenômenos empíricos. por outro lado, nesse espaço criado pelo objeto transcendental, surgem as metafísicas especulativas, que procuram ultrapassar a penúria empírica do positivismo por acenos na direção da intuição, do imaginário. 

destas duas escolas pós-kantianas, os positivistas são assemelhados aos físicos, aos matemáticos, e por meio da linguagem métrica, da imaginação mecânica, procuram restituir aquela ordem perdida depois da crítica. os metafísicos, certamente mais próximo dos místicos, dos artistas (em sentido romântico, claro), ao passo que pareçam um tanto quanto pré-criticos em seu matafisicismo, em seus acenos na direção das essências, somente podem se constituir a partir da constatação da separação do ser e do fenômeno, da coisa e da representação, nesse vácuo que torna a ontologia um processo mais misterioso e enigmático.

foucault sobre o escatológico e o positivista, a promessa e a redução

interessados na discussão sobre dialética, abram a página 439 do "as palavras e as coisas de foucault", a seção "o empírico e o transcendental", em que foucault caracterizará o discurso positivista e escatológico, comte e marx, como de uma "ingenuidade pré-crítica" (p. 442).

o positivismo é um conhecimento da redução: um discurso que busca o ser discursivo anterior a qualquer discurso, capaz de falar o objeto em sua pureza pré-linguística, e por que não?, pré-humana, para-humano, meta-humano, etc.

a escatologia, por sua vez, é o discurso da promessa: o objeto será conhecido em sua pureza e nudez somente depois do discurso; será revelado por meio das críticas sucessivas ao discurso pretérito, sempre capazes de refazer e elevar sua relação com o objeto apreendido. é um discurso pós-linguístico, que por meio da linguagem, não obstante, ultrapassará os seus inconvenientes, para enfim conhecer aquilo que anteriormente era prometido conhecer.

sociedades frias e quentes: sobre as bases materiais da história

1. o que a teoria marxista-comunista deseja? pelo exame do desenvolvimento histórico, empreender uma crítica teórica das ciências, e formul...