quinta-feira, 13 de julho de 2023

sobre PAIXÕES, de DERRIDA

"Tanto na amizade quanto na cortesia, não haveria um duplo dever: não seria exatamente evitar, a qualquer preço, a linguagem do rito e a linguagem do dever? [...] Um gesto "de amizade" ou "de cortesia" não seria nem amigável nem cortês se obedecesse pura e simplesmente a uma regra ritual. Mas esse dever de fugir à regra da conveniência ritualizada pede também um comportamento além da própria linguagem do dever. Não se pode ser amigo ou cortês por dever".

p. 13

contra Kant:

"Haveria, pois, um dever de não agir segundo o dever em conformidade: nem com o dever, diria Kant (pflichtmassig), nem mesmo por dever (aus Pflicht)? Como um tal dever, um contra-dever, nos endividaria? Com relação a quê? Com relação a quem?

p. 13 -14

"seria grosseiro parecer fazer um gesto, por exemplo, responder a um convite, por simples dever. Tampouco seria amistoso responder a um amigo por dever [ou] em conformidade com o dever.".

"jogar com a aparência onde ali se faz com a intenção".

p. 14.

"quanto ao "é preciso" da amizade, assim como ao da cortesia, não basta dizer que ele não deve ser da ordem do dever". Ele nem mesmo deve assumir a forma de uma regra, menos ainda de uma regra ritual. A partir de um momento em que se submetesse à necessidade de aplicar a um caso a generalidade de um preceito, o gesto de amizade ou de cortesia destruir-se-ia de uma vez só. Seria vencido, abatido e destruído pela rigidez regular da regra, em outras palavras, da norma. Axioma do qual não se deve deduzir que somente se chega à amizade ou à cortesia [...] transgredindo todas as regras ou indo contra todos os deveres. A contra-regra também é uma regra".

p. 14 - 15.

"A contradição interna do conceito de CORTESIA [...] é que implica a regra e a invenção sem regra. Sua invenção é que se conheça a regra, sem nunca se ater a ela. É falta de cortesia ser apenas cortês, ser cortês por cortesia".

p. 15

"dever".

"retórica da responsabilidade", o "discurso responsável sobre a responsabilidade".

"Ao falar de discurso responsável sobre a responsabilidade, já implicamos que o próprio discurso deve se submeter às normas e à lei da qual fala. Essa implicação parece inelutável, mas desconcertante: qual poderia ser a responsabilidade, a qualidade ou a virtude da responsabilidade, de um discurso consequente que pretendesse demonstrar que uma responsabilidade nunca poderia ser assumida sem equívoco ou contradição? que a autojustificativa de uma decisão é impossível e não poderia, a priori e por razões estruturais, de maneira alguma responder por si própria?"

p. 16

há "alguma coisa determinada por um saber, [...] aquilo que se encontra em frente dos olhos, da boca, das mãos; como um objeto pro-posto ou pré-posto, uma questão a ser tratada, um sujeito proposto, portanto, da mesma forma, [...] tratar-se-ia também de um ob-sujeito adiantado, como um quebra-mar ou como o promontório de um cabo, uma armadura ou uma vestimenta de proteção".

p. 17.

como abordar de frente a um problema, de maneira não-oblíqua, sem dissimulação, sem artimanha, sem cálculo?

problema.

late 14c., probleme, "a difficult question proposed for discussion or solution; a riddle; a scientific topic for investigation," from Old French problème (14c.) and directly from Latin problema, from Greek problēma "a task, that which is proposed, a question;" also "anything projecting, headland, promontory; fence, barrier;" also "a problem in geometry," literally "thing put forward," from proballein "propose," from pro "forward" (from PIE root *per- (1) "forward") + ballein "to throw" (from PIE root *gwele- "to throw, reach").

The meaning "a difficulty" is mid-15c. Mathematical sense of "proposition requiring some operation to be performed" is from 1560s in English. Problem child, one in which problems of a personal or social character are manifested, is recorded by 1916. Phrase _______ problem in reference to a persistent and seemingly insoluble difficulty is attested from at least 1882, in Jewish problem. Response no problem "that is acceptable; that can be done without difficulty" is recorded from 1968.

also from late 14c.

Etymology

From Proto-Hellenic *prógʷlāmə. Equivalent to προβάλλω (probállōI throw before) +‎ -μᾰ (-ma).

Pronunciation


 
  • IPA(key)/pró.blɛː.ma/ → /ˈpro.βli.ma/ → /ˈpro.vli.ma/

Noun[edit]

πρόβλημᾰ  (próblēman (genitive προβλήμᾰτος); third declension


  1. anything thrown forward or projecting quotations ▲
    1. hindranceobstacle quotations ▲
  2. anything put before one as a defense, bulwarkbarrierscreenshieldwall quotations ▼
    1. (with genitive) a defense against a thing quotations ▲
  3. anything put forward as an excuse or screen quotations ▲
  4. that which is proposed as a taskbusiness quotations ▲
    1. (geometry) problem quotations ▲
    2. (Logic of Aristotle) a question as to whether a statement is so or not quotations ▼
    3. problemdifficulty quotations ▲


"Problema pode vir a designar aquele que, como se diz em francês, dá cobertura, endossando a responsabilidade de um outro ou se fazendo passar pelo outro, falando em nome de outro, aquele que se coloca à frente ou atrás de quem alguém se dissimula. Estamos pensando aqui na paixão de Filoctetes, em Ulisses, o oblíquo, - e na terceira pessoa (terstis), ao mesmo tempo testemunha (testis) inocente; ator - participante, mas também ator ao qual se faz desempenhar um papel, instrumento e delegado, agindo por representação, a saber, a criança problemática, Neoptólemo. Desse ponto de vista, a responsabilidade seria problemática, à medida suplementar que poderia ser às vezes, talvez mesmo sempre, aquela que se assumi não por si, em seu próprio nome e em frente ao outro (a mais clássica definição metafísica de responsabilidade), mas aquela que se deve assumir por um outro, no lugar, em nome do outro ou em seu nome como outro, frente a um outro, e um outro do outro, a saber, o inegável mesmo da ética".
p. 17 - 18

À MEDIDA SUPLEMENTAR - o outro termo

"à medida suplementar, dizíamos, mas devemos ir mais longe: à medida que a responsabilidade não apenas não diminui, mas, pelo contrário, surge numa estrutura que também é suplementar. Ela é sempre exercida em meu nome como em nome do outro [...]".
p. 18.

NARCISISMO

"Perfilam-se aqui os paradoxos infinitos daquilo que se chama com tanta tranquilidade de narcisismo: supõe que X, alguma coisa ou alguém (um rastro, uma obra, uma instituição, uma criança), use o teu nome, isto é, o teu título. Tradução ingênua ou fantasma comum: deste [você deu] teu nome a X, portanto tudo aquilo que retorna a X, de modo direto ou indireto, em linha reta ou oblíqua, retorna a ti, como um benefício para o teu narcisismo. Mas como não és teu nome nem teu título e que, como o nome e ou o título, X passa muito bem sem ti, e sem tua vida, a saber, sem o local para onde alguma coisa pudesse retornar, como aí estão a definição e a própria possibilidade de qualquer rastro, de qualquer nome e de qualquer título, teu narcisismo fica frustrado a priori quanto aquilo de que se beneficia ou espera se beneficiar".

"Inversamente, supõe que X recuse teu nome ou teu título; supõe que, por uma razão qualquer, X se livre dele e escolha para si um outro nome, fazendo uma espécie de desmame do desmame original; então, teu narcisismo, duplamente ferido, ficará por isso mesmo ainda mais enriquecido: aquele que usa, usou, ou terá usado teu nome parece bastante livre, poderoso, criador ou autônomo para viver só e radicalmente passar bem sem ti e sem teu nome. Retorna a teu nome, no mais secreto do teu nome, poder desaparecer em teu nome. E portanto, não voltar a si, o que é a condição do dom (por exemplo, do nome), como também de toda expansão de si, de toda elevação de si, de toda auctoritas".

"Nos dois casos dessa mesma paixão dividida, é impossível dissociar o maior benefício e a maior privação. Consequentemente, é impossível construir um conceito não-contraditório ou coerente de narcisismo, e, portanto, dar um sentido unívoco ao eu e, segundo a expressão de Baudelaire, "sem cerimônia" É o segredo do arco ou da corda instrumental (neura) conforme Filoctetes, conforme a paixão segundo Filoctetes: a criança é o problema, sempre, eis a verdade".
p. 22-23.

problema: "Filoctetes faz portanto uso suplementar da palavra problema: o substituto, o suplente, a prótese, aquilo ou aquele que se coloca à frente para se proteger dissimulando-se, aquilo (aquele) que vem no lugar ou no nome do outro, a responsabilidade delegada ou desviada".

p. 57

"confissão ou autocrítica: dever-se-ia sorrir à hipótese da mais hiperbólica hybris, a saber, a hipótese de que esse "leitor crítico" (critical reader) seria, em suma, um "leitor autocrítico" (critica de si, mas crítica de quem, ao certo? A quem o refletido remeteria aqui?), um leitor que se porta e se transporta por si mesmo, sobretudo já não precisando de "mim" para isso, de um eu que, ele próprio, já não precisaria de ninguém para fazer todas as perguntas ou todas objeções críticas que se queira".

p. 23

"a re-moralização da desconstrução [...] um novo sono dogmático".

p. 26 - 27.

"excessos"

p. 27

"isto não é uma ceia [...] a amizade irônica que nos reúne".

p. 32

"há uma arte da não-resposta ou da resposta diferida que é uma retórica da guerra, uma artimanha polêmica. O silêncio polido pode se tornar a arma mais insolente e a ironia mais mordaz".

p. 36

defeito, pretensão...: "tornar-se obra de arte (performance ou performativo literário, ficção, obra), jogo estetizante de um discurso do qual se esperava uma resposta séria, pensante ou filosófica".

p. 33

"a tentativa de se fazer ouvir"

p. 39

"que o próprio leitor crítico esteja exposto a priori e sem fim a alguma leitura crítica".

p. 41

"o estar-aí do segredo não concerne mais ao privado do que ao público. Não é uma interioridade privada, que seria preciso desvendar, confessar, declarar, isto é, pelo qual seria preciso responder e prestar contas e tematizar às claras. Quem alguma vez avaliaria o grau exato de uma tematização para julgá-la, enfim, suficiente? E há violência pior do que aquela que consiste em requerer resposta, em exigir que se preste contas de tudo e, além disso, de preferência tematicamente?"

p. 42 - 43

o segredo não é místico.

p. 44.

"Há segredo. Mas ele não se dissimula. Heterogêneo em relação ao escondido, ao obscuro, ao noturno, ao invisível, ao dissimulável, até mesmo ao não-manifesto em geral, ele não é desvendável. Permanece inviolável até quando se acredita tê-lo revelado......

p. 44

literatura: o direito de dizer tudo.

p. 47

ficção, literatura, dever, responsabilidade, verdade, sujeito, testemunho

p. 48

a solidão absoluta de uma paixão sem martírios.

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