sexta-feira, 14 de julho de 2023

Um alienista criminalista, Maandon de Montyel, em 1892

A população das cadeias e dos presidios, para um analysta profundo da sociedade, não parece mais antisocial que uma boa parte da população livre. Um alienista criminalista, Maandon de Montyel, escreveu: << Cada um de nós trás no cerebro um criminoso que dormita e cujo despertar depende em parte da sua lethargia, em parte do grau do excitante, de sorte que o delinquente de amanhã, conforme as circumstancias, será talvez o leitor, serei talvez eu >> [Archives d'anthropologie criminelle, 1892.] Marandon dá ao termo criminoso a significação que, mais exactamente, se applica ao monstro do crime. Quanto mais verdadeiro é então o seu pensamento, dando-se á palavra criminoso a significação do autor de acto antisocial! Pode-se mesmo dizer nesse caso que o criminoso não dormita no cerebro, mas está muito bem acordado.

<< D'esta exposição summaria resulta que as conclusões anthropologicas ou sociaes que os criminalistas tiraram dos seus estudos das estatisticas judiciarias e penitenciarias, das medições da população das prisões, véem feridas de impotencia. Assentam sobre excepções e não sobre a generalidade dos autores de actos antisociaes. Não quero dizer que todas essas conclusões sejjam falsas: podem conter uma parte de verdade, sobretudo no que é concernente ao estudo dos factores: meio social e meio cosmico. Com effeito o criminoso legal pode nesse caso ser justamente considerado como um specimen de antisocial, sobre que actuam os meio social e cosmico nas mesmas condições que sobre a generalidade dos antisociaes occultos. Ao contrario, no que é concernente ao factor individual, as conclusões deduzidas pelos criminalistas são viciadas por falta de termo de comparação segura: d'onde resulta que não se pode generalizar e estabelecer um typo criminoso; quando muito podem estabelecer-se alguns typos criminosos.

<< Na opinião de todos os criminalistas contemporaneos, o crime tem como causas geradoras tres factores: meio individual, meio social e meio cosmico. Por meio individual intendem a conformação craniana, cerebral, o temperamento, a conformação do corpo, numa palavra a maneira de ser de todo o organismo physico. Por meio social intendem a educação, a instrucção, os usos e costumes da collectividade ambiente, as condições da vida economica, intellectual e moral. Por meio cosmico intendem a temperatura, o estado hygrometrico, electrico, da atmosphera physica do solo onde vive o autor do acto antisocial. >>


HAMON, A. Determinismo e responsabilidade. tradução Bel-Adam. Lisboa: Antiga Casa Bertrand - José Bastos & Cia, 1910, p. 12 - 13.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

HUSSERL CONTRA A PSICOLOGIA NATURALISTA

A crítica de Husserl aos psicólogos naturalistas exorta o saber a trabalhar não sobre os "dados primeiros”, i.e., as coisas-em-si anter...